Como o Café Inspirou Grandes Escritores
Com toda certeza eu não sou um desses grandes escritores, mas desde que comecei a escrever com certa dedicação para este blog, percebi que não há companhia melhor para a literatura do que uma boa xícara de café e meu consumo teve um aumento significativo (e consequentemente a conta dele). Se você é daqueles que gostam do ritual de preparar o café, sentir o aroma invadindo o ambiente e separar aquele trecho especial de um livro para acompanhar, saiba que não está só: café e literatura sempre caminharam juntos, lado a lado, inspirando histórias e provocando encontros que mudaram o rumo da cultura.
Há séculos os cafés históricos são mais do que simples endereços: são verdadeiros refúgios de leitura, criação e troca de ideias. Ao imaginá-los, é impossível não pensar no Café de Flore ou Les Deux Magots, em Paris, onde intelectuais e escritores famosos buscavam inspiração entre goles e divagações. O próprio Jean-Paul Sartre, ao lado de Simone de Beauvoir, fazia do café seu escritório literário. Era lá que, mantendo a tradição do café, os diálogos filosóficos atravessavam noites: “O café era o lugar onde me refugiei para escrever, porque ali não se era de ninguém, e lá eu era só eu” – como relatou em suas memórias.
A ligação entre escritor e café atravessa continentes. No Brasil, essa relação ganha contornos de história e pertencimento. O café é personagem em muitos romances, especialmente nas obras de Jorge Amado. Ao narrar a vida em Ilhéus, em “Gabriela, Cravo e Canela”, ele faz do grão símbolo de transformação social e econômica. Lembro de um trecho saboroso, onde a manhã começa:
“As primeiras horas do dia chegavam carregadas de aromas: café torrado e moído, pão quente no forno, o cheiro da terra úmida…”. É como se a leitura ganhasse cor e cheiro, transcendendo todo simples ato de folhear páginas (você não sentiu o cheiro ao ler esse trecho? Eu sim!).
Costumo pensar que o Brasil literário não seria o mesmo sem Machado de Assis. Nas crônicas e nos romances, o café é sinal de hospitalidade e certo rito burguês. Em “Dom Casmurro”, por exemplo, Bento Santiago observa os costumes da mãe, Dona Glória: “Recolheu-se à biblioteca, onde a esperava uma xícara de café fresco, feita com os grãos moídos da véspera, como era de seu gosto.” Mais do que mero detalhe, o café é a moldura de cenas domésticas, aquelas em que os sentimentos humanos brotam.
Balzac é capítulo à parte nessa história do café na cultura literária. O escritor francês é praticamente um patrono dos excessos da cafeína. Chegou a registrar em suas anotações:
“O café cai no estômago e uma tempestade começa. As ideias movem-se como batalhões de um grande exército no campo de batalha e a batalha começa. As recordações chegam a galope…”
Não é difícil acreditar que muitas personagens das suas vastas narrativas nasceram sob efeito de noites insones e inúmeras xícaras.
Já Ernest Hemingway encontrava nos cafés de Paris uma espécie de casa universal para quem escreve e lê. O ambiente da cafeteria servia como cenário recorrente em suas histórias, especialmente em “O Sol Também Se Levanta”, onde lemos: “Tomávamos café e voltávamos para a conversa, como se o tempo ali dentro não existisse.” Confesso que, relendo este trecho, tento imaginar como seria me perder por horas em um café qualquer, apenas ouvindo fragmentos de histórias e imaginando encontrar outros leitores daquele mesmo momento.
Lisboa, por sua vez, guarda com carinho o Café A Brasileira, cenário e inspiração constante para Fernando Pessoa. Tenho para mim que, diante de uma xícara fumegante, Pessoa encontrou aquela solidão povoada por vozes e heterônimos, tão própria da sua poesia. Ele, que eternizou frases como:
“O café é a bebida da conversação e da reflexão. Tomo café porque penso. E penso porque tomo café.”
trecho do Livro do Desassossego de Fernando Pessoa, mais especificamente das “CONFISSÕES DE BERNADO SOARES”, um dos heterÔnimos de Pessoa
Sempre encontro conforto nessas palavras, como se estivéssemos, partilhando o mesmo instante de silêncio e imaginação.
Além dos grandes nomes, há algo muito humano e próximo de todos nós nessa relação. Seja ao reler um poema de Drummond (“Café, doce café, amargo consolo dos que nada têm, dos que tudo pensam…”), seja ao espiar entre as páginas do próprio cotidiano, percebo o quanto o café está presente nos rituais de leitura e escrita. Talvez por isso os cafés históricos tenham testemunhado tantas ideias inovadoras nascendo entre goles de esperança e inquietação.
Não raro, escolho um título novo para acompanhar minha bebida favorita: livros de contos, romances ambientados em cafeterias, crônicas urbanas recheadas de reflexões sobre o café na vida moderna. Nessas leituras, descubro novas curiosidades do café e percebo como ele permanece um símbolo de encontro, pausa e inspiração, atravessando gerações e estilos literários.
O que mais me fascina nessa ligação é a simplicidade cotidiana: abrir um livro, preparar o café e desacelerar para apreciar o que ambos têm de melhor. O tempo parece correr em outro ritmo. Entre um gole e um parágrafo, surgem ideias, sonhos e, quem sabe, versos ainda não escritos. O café na cultura literária representa essa magia da pausa criativa — um convite para que cada um de nós descubra seu próprio ritual.
Antes de encerrar, deixo um convite para você que chegou até aqui: compartilhe suas experiências nos comentários. Que livro pede um café especial ao seu lado? Existe um autor cujas histórias evocam esse aroma inconfundível para você? Talvez um trecho que marcou alguma manhã ou final de tarde? Vamos transformar nosso espaço virtual em uma grande mesa de conversa, daquelas em que as melhores ideias surgem sempre acompanhadas por uma boa xícara de café e belas histórias para contar.